Tornou-se comum ouvir dizer que o ecossistema do consumo mudou, ou que a era da economia digital veio revolucionar os comportamentos em relação ao próprio consumo. Mas apesar de existirem vários factores que contribuiram para todos estes cenários de mudança, existe uma força que continua a exercer a sua influência de forma quase intemporal: O poder que as audiências exercem sobre a decisão das marcas.
As audiências alimentam a razão do investimento que deverá, supostamente, gerar lucro e os anunciantes dependem deste indicador para justificar e responsabilizar esse investimento. Em bom rigor, por muitos outros factores que possam existir, a verdade é que todas as empresas que precisam de comunicar e de apelar aos seus públicos dependem das audiências para justificar quase tudo o que fazem.
A necessidade premente de se aceder a estes dados parece ter sido imutável às várias revoluções da sociedade do consumo, sobretudo com a utilização massificada dos meios digitais, onde a medição de resultados passou a ser mais objectiva e quase imediata.
No entanto, este fenómeno não significa que as próprias audiências não tenham registado qualquer tipo de evolução, antes pelo contrário, a sua leitura passou a ser de tal modo complexa (em dimensão, estrutura e diversidade de dados) que exige da empresa recursos significativos para que haja capacidade de produzir conhecimento a um nível de confiança que suporte qualquer tomada de decisão.
O Enquadramento Racional das Audiências
Numa perspectiva de mercado global temos vindo a assistir a um movimento de alguma convergência entre os segmentos de media mais caracterizados (Paid, Owned e Earned/Shared), embora seja ainda bastante prematuro poder quantificar o valor efectivo deste contexto, para além do seu enquadramento como uma tendência da indústria.
Esta evolução poderá ter como provável consequência uma maior integração das áreas que têm vindo a sustentar esta mesma indústria: Advertising, Content e Social, originando um grande desafio em toda a sua cadeia de relacionamento, ao colocar os seus principais actores (Agências de Media, Comunicação e os próprios Anunciantes) no centro de grandes questões que poderão vir a marcar uma nova geração de práticas neste mercado.
Na “agenda” destas questões poderá figurar o estabelecimento de regras normalizadas para temas como (entre outros):
- Conceptualização e Alinhamento de Métricas
- Modelos Padronizados de Medição
- Regras de Reporting
A concordância num ponto de equilíbrio em relação ao conhecimento técnico existente sobre estes temas, de forma equitativa, e na proporção do nível de evolução do próprio mercado, seria o cenário ideal, mas admite-se que estejamos na presença de um desafio extremamente complexo, tendo em consideração a constante mutação que se tem vindo a registar.
A aplicação do conhecimento será sempre a forma mais adequada de gerir o risco do investimento das marcas em meios mais dinâmicos, sobre os quais não exista um domínio ou compreensão dos seus princípios fundamentais. A este nível situam-se, por exemplo, as plataformas de Media Sociais, onde a regularidade de alterações e melhorias funcionais é constante, inviabilizando a implementação de boas práticas efectivamente comprovadas, para além do acesso restrito a determinadas componentes estratégicas que regem o comportamento dos dados (algoritmos) com impacto directo nos conteúdos orgânicos.
Por outro lado, os Anunciantes necessitam de absorver novas fontes de informação sobre o impacto das suas acções de comunicação e de influência, muito para além da cobertura massificada de públicos, traduzida na leitura típica do volume de impressões. O registo de audiências deverá permitir, para além de abordagens mais granulares, a ligação a perfis individualizados de acordo com a condição humana do consumidor face à diversidade de paradigmas que têm vindo a ser criados em relação às decisões de compra e de uso, muito por culpa dos cenários de mudança já aqui referidos.
Actualmente, o analista de meios tem de lidar com conceitos de medição intimamente ligados a novos hábitos de comportamento (Zero Moment of Truth, Touch Point, Customer Journey, etc.), colocando em evidência a valorização monetária de cada meio, em função do presumível peso que cada um terá na decisão de consumo (Attribution Model), ao mesmo tempo que tenta integrar métodos mais conservadores ainda estabelecidos nos canais de media tradicionais.
Neste contexto, as audiências possuem hoje uma atribuição de responsabilidade muito mais profunda e abrangente, pelo facto de lidarem com um leque mais sofisticado de meios e de consumidores, onde a tecnologia desempenha um papel crucial no acesso à informação para tomada de decisão.
A Tecnologia de Medição dos Media
Perante uma indústria completamente fragmentada ao nível dos seus canais, será possível afirmar que, dificilmente, alguém possuirá a expertise num único lugar. Esta constatação irá obrigar a que todos os participantes e interessados na cadeia de produção (Agências, Anunciantes e restantes Fornecedores e Parceiros) olhem para a mesma direcção em termos de conceitos, métricas e, preferencialmente, para um mesmo modelo de dashboard.
São muito poucas as marcas que dominam um ecossistema ao ponto de poderem criar um sistema de medição com um potencial holístico de fazer inveja à própria indústria. O exemplo da Apple aponta para um caminho talvez mais lógico na perspectiva da evolução da economia digital ao estabelecer um modelo de medição que beneficia da integração da própria tecnologia que produz e comercializa, adaptado ao conceito Multi-tasking, para diferentes Touch Point.
Mais importante do que olhar para a panóplia de ferramentas “para todos os gostos” que surgiram na sequência dos Media Sociais (e que possuem um baixo nível de integração com outros sistemas internos da empresa) será talvez a união de esforços na construção de uma framework de base a um Modelo de Medição de Media que congregue um racional de integração de forma optimizada para toda a indústria.
De nada servirá a tecnologia disponível se a mesma não for direccionada de forma eficaz e de acordo com as exigências de funcionamento do mercado. A luta pela Atenção Visual Líquida dos consumidores deve exigir que as audiências sejam maximizadas quanto ao seu potencial gerador de conhecimento em termos de rigor e de abrangência.
O Valor Humano das Audiências
Já vivemos em plena sociedade da informação há tempo suficiente para se terem criado novos patamares de história, e muita aprendizagem se tem baseado neste pressuposto, sobretudo no estudo de conteúdos da Internet, pelo que podemos afirmar que: “longe” vai o tempo em que as marcas se preocupavam apenas com as populares PageViews, naquela que foi a golden age das práticas mais clássicas de Web Analytics, e que marcou o período de 2004 a 2007 (aprox.).
Com a penetração do acesso Mobile em larga escala, por um lado, e a democratização dos dados sobre cada utilizador, por outro, as empresas têm vindo a ampliar as suas análises estatísticas na perspectiva do indivíduo (user-centric), no sentido de recolher dados a partir de níveis dimensionais muito próximos da nossa realidade consciente, ou seja, avaliar padrões de comportamentos que caracterizam a maioria dos hábitos do nosso quotidiano.
A futura integração da nova vaga tecnológica baseada em Wearables poderá proporcionar o acesso a um novo patamar do conhecimento, assente numa escala de dados desenhada para construir o universo de cada indivíduo, onde o reconhecimento de padrões e de previsões será feito numa metodologia mais refinada, mas, eventualmente, ainda mais complexa, em termos de metodologias de drill down e de segmentação avançada, pelo potencial da informação gerada ao nível da personalidade.
É no amplo enquadramento destas tendências que a tarefa de medição de dados associada ao estudo das audiências estará a caminhar para uma abordagem cada vez mais centralizada nas componentes humanas do consumidor, onde se poderá incluir (de forma perfeitamente integrada) as mais recentes aplicações da neurociência do consumo (em termos de biofeedback), numa perspectiva de observação próxima do conceito Humanytics (termo sugerido pelo autor), baseado na utilização de métricas que resultem de acções sujeitas à intervenção humana, e sobre as quais seja possível obter uma leitura de dados fidedigna do envolvimento do consumidor em termos de resposta ou registo sensorial.
O Desafio do Conhecimento
A tradicional “compra de espaço” significa hoje, mais do que nunca, a aquisição de “memória” e de “envolvimento humano” e nada seria mais justo, na óptica do Anunciante, do que ver o seu investimento em canais de media avaliado em metodologias perfeitamente ajustadas à evolução deste conhecimento.
A medição de audiências e perfis de comportamento é uma tarefa muito dependente da tecnologia de informação e de capacidade analítica, que viu enriquecida as suas valência face a todas estas mudanças estruturais. Saber utilizar os conceitos adequados nas componentes de medição e efectuar a leitura correcta na interpretação contextual de Insights exige a escolha de parceiros que passem igualmente a dominar diversas áreas do conhecimento humano, porque será precisamente nesta vertente que irá estar centralizada a próxima geração de dados.