The Analytical Creativity

Da obsolescência do Facebook à Internet palpável – A visão de Mark Zuckerberg para a próxima Era Digital

Meta Dispositivos só atrapalham

A visão do Metaverse significa muito mais do que a apresentação trivial de uma nova tecnologia. Ao longo de 1 hora e 17 minutos, Mark Zuckerberg preparou de forma minuciosa a narrativa daquilo que representa o futuro do Facebook.

Mas este futuro não passa necessariamente pelo Facebook, enquanto plataforma de social media, tal como anunciado pelo seu fundador:

“From now on, we will be metaverse-first, not Facebook-first”

Foram muitos os pormenores e entrelinhas partilhadas nesta apresentação sobre aquilo que se poderá considerar como a próxima Era Digital na visão de Mark Zuckerberg. Os primeiros 4 minutos são suficientes para reter o essencial sobre o contexto do Metaverse, mas o horizonte desta visão é de tal modo vasto e ambicioso no plano futurista que vale a pena tentar perceber o seu alcance por etapas.

Uma operação de Rebranding envolta em polémica

A apresentação ao mundo da nova marca institucional do Facebook, que passa a designar-se por “Meta” – numa estratégia de posicionamento similar à Alphabet no universo Google – não deixa de ser considerada por alguns analistas como uma forma de desviar as atenções do recente caso “Facebook Papers”, despoletado por Frances Haugen, acerca das práticas da empresa na moderação de conteúdos.

Não se sabendo exactamente quais os impactos deste caso nos planos de Mark Zuckerberg a curto-prazo, a verdade é que a opinião pública não deixa também de dar o devido destaque à criação desta nova marca, ou não fosse o Facebook uma das maiores empresas de Media à escala global, com cerca de 2,89 mil milhões de utilizadores activos mensais.

Sendo a maior rede social do mundo, onde mais de 3 mil milhões de pessoas usam, pelo menos, e por mês, um dos produtos do seu ecossistema de aplicativos (Facebook, WhatsApp, Instagram ou Messenger) torna-se crítico perceber o sentido das suas decisões estratégicas ao mais alto nível, já que estas acabarão por afectar, directa ou indirectamente, toda a indústria de media, e em particular a digital.

Deste modo, destaco a seguir 6 grandes factores que emergem na criação desta nova marca institucional e o foco na construção do ecossistema Metaverse:

1.  A obsolescência do Facebook

Um dos aspectos que ficou bastante vincado ao longo do discurso de Mark Zuckerberg para sustentar este novo posicionamento estratégico é a passagem do Facebook enquanto produto de social media para um plano secundário.

Foram várias as expressões que não deixam dúvidas sobre esta intenção:

Hoje somos conhecidos como uma empresa de social media, mas no fundo somos uma empresa que desenvolve tecnologias para conectar pessoas

O Facebook nasceu num contexto específico” que deixou agora de ser relevante para a próxima fronteira a alcançar.

De agora em diante, o nosso principal foco será o Metaverse, não o Facebook

E remata na parte final: “Daqui a algum tempo, não será preciso usar o Facebook para aceder aos nossos outros serviços

É óbvio que esta plataforma (tal como a restante família de aplicativos) continuará a ser determinante na estratégia deste novo ecossistema, sobretudo pelas receitas que gera para tornar real toda a virtualidade do Metaverse – entre 2014 e 2020 o investimento global em publicidade, apenas no Facebook, atingiu os 2,26 mil milhões de dólares (fonte: Statista), suportado em mais de 10 milhões de anunciantes activos, dos quais cerca de 70% actuam fora dos EUA.

Mas em matéria de ganhos, a mensagem de Mark Zuckerberg é muito clara: O potencial de receita nos diversos ambientes do Metaverse será muito mais promissor (com as indústrias de entretenimento e de novos negócios virtuais à cabeça) restando muito pouco espaço, real ou virtual, para que a proeminência do Facebook volte a ser aquilo que fez dele o que hoje conhecemos.

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E sejamos racionais: Basta apenas que esta rede social deixe de ser o foco do entusiasmo do seu fundador para que alguma coisa venha a mudar.

2.  Os conceitos fundamentais do Metaverse

Na ideia de Mark Zuckerberg, o Metaverse representa a libertação de tudo aquilo que a tecnologia de hoje nos condiciona e limita em termos de interacção.

A frase que utilizou para caracterizar esta realidade é por demais evidente:

“Os dispositivos de hoje só atrapalham”

E para chegar a esta conclusão faz uma breve descrição histórica sobre a evolução dos formatos e dos conteúdos. Desde a evolução do texto para fotos e vídeos, à migração do desktop para a web e posteriormente para mobile, referindo que “a história da tecnologia nas nossas vidas foi sempre desafiada pelo poder da experimentação do mundo através de formatos cada vez mais ricos”.

E foi assim justamente como surgiu o Facebook, que mais não era do que “texto digitado em computadores” e mais tarde “utilizado em telefones com câmaras” permitindo que a Internet se tornasse mais visual, até que o vídeo se transformou no principal formato de interacção com os conteúdos.

Mas o Metaverse será o sucesso da Internet Móvel que irá permitir fazer tudo sem estarmos limitados a “espiar por uma janelinha” ou “vendo quadradinhos com rostos numa tela”, ou seja:

“fazer coisas que não se encaixam na visão que temos hoje dos computadores ou telefones”

Fundamentalmente: Usar uma Internet palpável onde “estaremos na experiência e não apenas a olhar para ela”, através da interoperabilidade de uma representação física corporificada.

Tudo isto passa pela construção de um novo ecossistema com vários aspectos estruturais de raíz:

  • Definição de normas;
  • Novas formas de governação;
  • Garantia de privacidade e segurança desde o momeno zero
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3.  A importância dos Media e da Economia Criativa

Considerando o peso da família de produtos do Facebook na despesa global em Media (já aqui referido), a importância dos anunciantes e de toda a economia criativa será critica nos dois sentidos (investimento vs retorno), porque as marcas e os negócios que hoje estão dependentes destes produtos irão querer acompanhar esta evolução e tirar partido daquilo que o Metaverse lhes poderá proporcionar.

E o que está desde já prometido por Mark Zuckerberg deixa no ar essa expectativa:

“As próximas plataformas de media serão ainda mais imersivas”

Aliás, os desafios para toda a Economia Criativa serão muitos, porque fica aberta a porta para: “Qualquer tipo de media que possa ser representado digitalmente – fotos, vídeos, arte, música, filmes, livros, jogos, etc.

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A indústria de jogos e entretenimento será uma das principais âncoras para atrair audiências para o Metaverse, quer pelo seu poder de engagement, quer pelas mais diversas opções de monetização.

Basicamente: “Muitas coisas que hoje são representadas por displays poderão ser hologramas no futuro”.

E remata, dizendo explicitamente: “Nada de TV física

4.  A indústria da Co-Criação

Este será, na minha opinião, talvez o factor mais importante de todos, porque dele depende uma parte fundamental da construção do ecossistema Metaverse e, consequentemente, do seu sucesso, tal como está idealizado por Mark Zuckerberg, que não se cansou de repetir (e seduzir), vezes sem conta, o papel muito particular dos criadores e developers neste contexto.

Essencialmente porque: “Há muito para construir no sentido de criar as experiências pensadas para o Metaverse”, apelando à profunda necessidade de investimento em recursos humanos especializados nas mais avançadas tecnologias de criação e programação, sobretudo em 3 grandes áreas:

  • Criadores de objectos digitais;
  • Criadores de serviços e experiências;
  • Criadores de mundos

A presença realista “é a chave para atrair pessoas a conectarem-se ao Metaverse” e para que isso seja uma realidade (ainda que virtual) há um enorme investimento em tecnologias muito concretas, que vão desde a interacção padronizada do movimento das mãos; a percepção dos ambientes e a sua sensação realista de profundidade, até à localização espacial dos conteúdos.

Para além do entretenimento (referido no ponto 3) há naturalmente também toda uma economia de novos negócios que irão dar lugar a futuros marketplaces próprios, orientados para a transação de itens digitais, bem como à criação de conteúdos destinados à aprendizagem imersiva nas mais diversas áreas da vida – Bem-estar, Trabalho, Educação, etc.

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A mensagem não podia ser mais clara: “Metaverse é sobre co-criação”, mas o bottom line é ainda mais determinante:

“No final do dia são os criadores e developers que irão criar e construir o Metaverse e torná-lo real”

5.  A democratização da MR (Mixed Reality)

O lançamento em Setembro último dos óculos Ray-Ban Smart Glasses, numa parceria entre a EssilorLuxottica e o Facebook, não foi apenas uma acção isolada, sabendo-se hoje aquilo que será o Metaverse.

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Na prática, Mark Zuckerberg pretende que as pessoas se habituem, cada vez mais, a usar headsets da forma mais normal e menos intrusiva possível nas suas vidas, sobretudo a fazerem tudo aquilo que já fazem de forma trivial no Facebook ou noutras redes sociais – reunir com amigos, família, trabalhar, aprender, brincar, comprar e criar.

E embora estes óculos não possuam ainda suporte para AR / VR são um primeiro passo para quem não teve qualquer contacto com o Facebook Oculus Quest ou outros dispositivos de realidade virtual.

Ao dar prioridade ao design em detrimento da tecnologia, o Facebook pretende captar e atrair audiências convencionais, incentivando-as a adoptar uma experimentação e aprendizagem que possibilite a introdução doseada de novas features que facilitem a migração para realidades mistas numa progressão ao ritmo de cada pessoa.

Trazer as interacções mais comuns em qualquer rede social (como tirar fotos ou criar vídeos e partilhá-los) para um dispositivo apadrinhado por uma das mais conhecidas e populares marcas de design de moda ocular abre caminho para que as pessoas incorporem este tipo de tecnologia nas suas vidas de forma “seamless”.

Para que o Metaverse tenha, no mínimo, o mesmo sucesso conquistado pelo Facebook em termos de popularidade à escala global, terá de haver uma efectiva democratização das realidades mistas equiparada ao consumo de tempo que actualmente é dedicado pelas pessoas às suas redes sociais favoritas.

6.  As Pessoas no centro da tecnologia

A insistência de Mark Zuckerberg em enfatizar o papel da tecnologia a favor das pessoas foi igualmente uma tónica constante neste discurso, ainda que isso possa ser apenas mais uma tentativa oportuna de atenuar a fricção perante a polémica do “Facebook Papers”.

E para defender esta circunstância começou por referir que: “Os nossos dispositivos continuam a ser desenvolvidos com base em apps, em vez de pessoas”, para depois reforçar aquela que será a principal missão da Meta:

“A empresa que desenvolve tecnologias com as pessoas em mente”

Dos vários processos e projectos tecnológicos em curso assente nesta premissa, destacaria em particular os seguintes, pelas suas especificidades:

  • Projecto Cambria: A preocupação para com o aspecto e a presença social dos avatares sob a égide: “VR for everyone”, no sentido de garantir a diversidade e a etnia na reprodução de características físicas, como a cor da pele, tipos de barba ou acessórios próprios, bem como o contacto visual natural e as expressões faciais em tempo real;
  • A confiança e a segurança na propriedade de cada avatar, considerando que: “Os avatares serão tão comuns quanto hoje as fotos de perfil” já que estes servirão como meio de login em muitos dos serviços do Metaverse.
  • Os novos modelos associados ao conceito de propriedade e direitos (ownership) para que as pessoas confiem que realmente possuem algo e haja um efectivo sentimento de posse, tendo em perspectiva o amplo espaço para trocas comerciais totalmente desmaterializadas, sobretudo através de criptomoedas e NFTs.
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Uma revolução em marcha para a próxima Era Digital

Tornar o Metaverse uma realidade – ainda que virtual – irá demorar tempo e este aspecto é assumido por Mark Zuckerberg, quando este refere ser um caminho para as próximas décadas.

No entanto, há muitas coisas já a acontecer: “Mesmo que esteja longe já estão a ser trabalhados conceitos fundamentais”, e a tecnologia disruptiva já nos habituou por várias vezes a demonstrar que a sua noção de tempo é bem distante daquela que a humanidade percepciona no seu dia-a-dia.

É um facto que o mundo está cada vez mais digitalizado, mas aquilo que o Metaverse promete é muito mais do que a humanidade poderia imaginar – Na visão de quem criou a maior plataforma de conexão social do mundo, a Era Digital só agora está a começar.

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